As brincadeiras e os jogos pré-desportivos integram um conjunto de práticas corporais que possibilitam um trabalho educativo anterior ao ensino dos esportes. Possui como principais vantagens o caráter de ludicidade, bem como a adaptabilidade de regras, espaços e materiais para sua realização. Conheceremos as diferenças (entre brincadeira, jogo e esporte), analisando a partir dos jogos pré-desportivos a produção de discursos que deles possam se produzir para desenvolver ações que envolvam equidade, empatia e respeito.
Brincadeira, jogo e esporte não são a mesma coisa. Porém, apresentam importantes relações que podem ser trabalhadas pelas práticas corporais do componente Educação Física no contexto escolar. Convém antes revisitar alguns conceitos anteriores para facilitar este entendimento:
Recreação: é um vocabulário que apresenta certa dificuldade de conceituação, mas assim como o vocabulário “recriação” têm em comum a fonte recreare (que significa tornar a criar). Talvez a melhor forma para a entender possa estar no vocabulário inglês “play” (traduzido como alegria, prazer e satisfação naquilo que se faz). A recreação pode ser compreendida como atividade realizada fora do tempo de trabalho e livre das obrigações familiares, permitindo ações criadoras individuais e/ou coletivas, construídas por elementos como a espontaneidade, a livre escolha, a diversão, o entretenimento, o passatempo, a distração e o lazer. As brincadeiras e os jogos materializam na prática sua expressão e seus benefícios são de ordem afetiva, cultural, intelectual e social. Poder usufruir de atividades recreativas significa contribuir também para a melhoria da qualidade de vida ativa das pessoas em todas as idades.
Lúdico: Seu entendimento depende do contexto em que este se encontra empregado. Vários autores/as costumam utilizar diferentes palavras para identificar o lúdico, tais como brinquedo, brincadeira e jogo. Aqui o importante não é pensar o lúdico em si mesmo, mas sempre na relação que estabelece com os sujeitos, quando estes estabelecem relações com os outros. O lúdico não tem um momento e nem um lugar específico, pois vai representar o agora. Vai se expressando na ação das pessoas em relação à liberdade de suas escolhas pela aventura, satisfação e o querer fazer. Assim, os signos e os símbolos vão dando magia à espontaneidade, num processo de constituição da capacidade lúdica onde a presença do outro/a é sempre fundamental.
Brincadeira: Encontra-se presente desde a origem da humanidade, como um fenômeno social que expressa a condição humana de existir (cultural, histórica, ética, estética e política). A brincadeira é uma atividade espontânea e livre que não pode ser delimitada, nem tampouco possuir espaço e tempo pré-determinado, com um fim em si mesma de aprendizagens socioculturais e que se insere no mundo real ao ser levada pelo mundo imaginário. Ela propicia saltos qualitativos para a pessoa sobre a aprendizagem e o seu desenvolvimento integral, indo para além do aspecto psíquico.
Brinquedo: é impossível precisar a origem do brinquedo, mas afirmar que em todas as civilizações, de alguma forma, esteve sempre presente na vida dos adultos e das crianças. O uso que se faz dele terá conotações diferenciadas, em consequência das influências socioculturais expressas nas ações da pessoa que brinca. Pelo contexto empregado, muitas vezes é necessário substituir a palavra “brinquedo”, no processo de leitura e interpretação, pela palavra “jogo” e/ou “brincadeira”. Pois, este ainda pode vir a designar tanto o objeto quanto a ação de brincar, dependendo da tradução deste vocabulário. O brinquedo supõe uma relação íntima com a pessoa, uma indeterminação quanto ao uso na ausência de um sistema de regras que organizam sua utilização e como alvo será residido no próprio processo e não no resultado da ação.
Jogo: Em relação ao jogo, é possível dizer que se trata de uma ideia anterior ao desenvolvimento da cultura e da sociedade porque trabalha basicamente com a função significante: tudo o que diz respeito a ele possui um determinado sentido e significado. E a utilização do jogo, em sentido cultural e histórico, pode implicar em relações de funções biológicas, educacionais e sociais por exemplo. Enquanto a brincadeira é simbólica, o jogo é funcional. Ou seja, se a brincadeira tem como características ser livre e ter um fim em si mesma, o jogo vai incluir a presença de um objetivo final a ser alcançado. Isso vai demandar para o jogo o aparecimento de regras pré-estabelecidas de relações com as regras sociais, morais e culturais existentes na sociedade. Outro fator para se perceber a diferença entre jogo e brincadeira é a ideia de oponência, do confronto entre duas ou mais pessoas que, ao mesmo tempo, lutam por um único objeto (brinquedo). É a posse do objeto que pode levar à condição objetiva final (vitória).
Os jogos podem apresentar ainda uma infinidade de classificações, dependendo do/a autor/a consultado para facilitar sua compreensão. Quando se fala em jogos pré-desportivos, considera-se como explicação inicial a ideia de que são jogos que vão se assemelhando às práticas corporais esportivas oficiais, mas que não possuem as mesmas regras institucionalizadas por federações e/ou confederações. As exigências que existem em relação ao número de participantes, os modos de se jogar, os aparatos e/ou implementos a serem utilizados e o espaço necessário para a realização deste tipo de jogo são bastante maleáveis.
Assim, os jogos desportivos situam-se como possibilidades de jogo que podem ser trabalhados de diferentes maneiras e que contribuem posteriormente para a aprendizagem dos fundamentos técnicos e táticos dos esportes. Para exemplificação, observe abaixo três atividades que vão se apresentar em suas condições de jogabilidade como práticas corporais de jogos pré- -desportivos. É necessário destacar aqui que estas vão se referir à especificidade do trabalho educativo que perpassa por alguns dos fundamentos do futebol, do handebol e do voleibol:
Jogo: Bobinho
Descrição: Uma roda é formada com parte e/ou toda a turma e um/a estudante fica no centro como “bobinho”. Os/as demais estudantes ficam trocando dribles e passes (fundamento do futebol) entre si com os pés, podendo dar somente três toques na bola antes de passá-la e sem deixar que “bobinho” toque nela. Cada vez que “bobinho” toca na bola, troca de lugar com quem perdeu a bola e este/a passa à sua condição. Se o/a estudante perde a bola para fora do círculo, também deve assumir o papel de “bobinho”.
Variação: Aumentar ou diminuir o número de toques na bola, acrescentar mais pessoas como “bobinho” e colocar mais bolas em jogo.
Recursos: Bola de futebol ou similar.
Jogo: Torre
Descrição: Coloca-se um cone sobre a mesa e demarca-se um círculo à sua volta, em tamanho que possibilite deslocamentos para todas as direções. Uma/a estudante é escolhida/a para ficar dentro do círculo e proteger o cone usando braços e pernas. Outros/as três são escolhidos/as para ficar ao redor do círculo trocando passes e arremessos (fundamentos do handebol) até arremessar e derrubar o cone. Quando a bola for interceptada por quem estiver no interior do círculo, troca de lugar com aquele/a que perdeu a posse da bola.
Variação: Podem ser colocados/as mais estudantes no interior do círculo e/ou ao seu redor, bem como acrescentar mais bolas ao jogo.
Recursos: Bola de borracha pequena, mesa (de sala de aula), cone e giz.
Jogo: Limpeza
Descrição: Duas equipes se posicionam em lados opostos à rede. Cada integrante das duas equipes, a qualquer momento em que estiver com a bola em mãos, deverá jogá-la para o outro lado (utilizando os fundamentos do voleibol) sempre por cima da rede. Ao comando do/a professor/a, a equipe vencedora será aquela que estiver com o menor número de bolas no seu campo.
Variações: Colocar bolas de diferentes pesos, tamanhos e em número superior ao número de participantes.
Recursos: Bolas e rede de voleibol.
Atividade de aprendizagem:
(INEP - ENEM 2020) Estória de um gibi da Turma da Mônica, intitulada Brincadeira de menino Mônica, conhecida personagem de Maurício de Sousa, passa na casa da sua melhor amiga, Magali, para convidá-la para brincar. A mãe da Magali diz que a menina está com gripe e precisa de repouso, e por isso não vai poder sair de casa. Mônica sai triste e pensativa, quando cruza com o Cebolinha e convida-o para brincar com ela de “casinha”. Ele se recusa e diz: “— Homem não blinca de casinha”, e Mônica retruca: “— Ah, Cebolinha! Que preconceito!”. Cebolinha responde: “— Pleconceito uma ova! Casinha é coisa de menina! Vou te mostlar o que é blincadeila de menino!”. Enquanto ele sai de cena, Mônica fica debaixo de uma árvore brincando sozinha e Cebolinha faz várias aparições com brinquedos e brincadeiras supostamente só de meninos: aparece “voando” num skate, mas cai na frente dela. Depois aparece numa bicicleta, mas bate numa pedra e cai. Aparece de patins, tropeça e cai. Reaparece chutando uma bola, mas a bola bate na árvore e volta acertando sua cabeça. Desanimado e desistindo das “suas” brincadeiras, Cebolinha aparece no último quadro, ao lado da Mônica, brincando de “casinha”. OLIVEIRA, A. B.; PERIM, G. L. (Org.). Fundamentos pedagógicos para o programa Segundo Tempo. Brasília: Ministério do Esporte, 2008 (adaptado). Refletindo sobre as relações de gênero nas brincadeiras infantis, a estória mostra que:
(A) Meninos podem se envolver com os mesmos brinquedos e brincadeiras que meninas.
(B) Meninas são mais frágeis e por isso devem se envolver em brincadeiras mais passivas.
(C) Meninos são mais habilidosos do que meninas e por isso se envolvem em atividades diferentes.
(D) Meninas tendem a reproduzir mais os estereótipos de gênero em suas práticas corporais do que os meninos.
(E) Meninos e meninas devem se envolver em atividades distintas, como, respectivamente, o futebol e a “casinha”.
REFERÊNCIA:
GOIÁS, Secretaria de Estado da Educação. Apostila Goiás Tec 3º bimestre: Educação Física. 2025. p. 15 a 17
Nenhum comentário:
Postar um comentário