No
que se refere aos distúrbios da alimentação podemos dividir a
humanidade em dois grandes grupos, aquelas que comem de menos e
aqueles que comem demais. Os primeiros compreendem aqueles para os
quais falta comida – os habitantes do Terceiro Mundo – e
aqueles que, mesmo dispondo de alimento, recusam-no por razões
emocionais. A abundância de comida e a voracidade, por
sua vez, geraram o problema da obesidade, que, mesmo em países
como o Brasil, é hoje uma questão de saúde pública.
A
extrema obesidade está associada a diabetes, hipertensão
arterial, doença cardiovascular, problemas
articulares. E resulta numa imagem corporal que não é
das mais agradáveis – ao contrário do que acontecia no passado,
quando a maior ameaça era representada pela desnutrição.
Mulheres gordinhas eram valorizadas, como se pode ver nos quadros de
Rubens ou de Cézanne. Na época deste último, o grande espectro era
a tuberculose, comumente associada à extrema magreza. Pela
mesma razão, na cultura hotentote são valorizadas mulheres
com nádegas grandes, a gordura ali depositada equivale a uma
“poupança” mais importante que qualquer poupança bancária. As
coisas mudaram: “You can never be too rich or to thin” é um dito
corrente nos Estados Unidos, ou seja: “excesso de riqueza ou de
magreza não prejudica”. Riqueza é símbolo de sucesso, magreza é
a imagem da elegância. O corpo transformou-se num objeto a
ser exibido. E isso resulta num conflito: de um lado está a
indústria da alimentação, com toda a sua gigantesca
propaganda, ninguém mais vai ao cinema sem levar junto um contêiner
com pipocas (como se a pessoa não pudesse passar duas horas sem
comer). De outro lado, temos o estigma representado pela obesidade.
O
resultado é um conflito psíquico que se manifesta de várias
maneiras, mais notavelmente pela anorexia nervosa. Que não é
coisa nova. Já na Idade Média, Santa Catarina de Siena tornou-se
famosa por evitar o alimento. Comia pouquíssimo, apenas o suficiente
para não morrer de fome. Mas a razão ali era religiosa; voracidade
era pecado, contenção alimentar era virtude. O conflito
emocional que leva à anorexia é de outra natureza, e bem mais
recente. Até os anos 50 a anorexia nervosa era pouco mais que uma
curiosidade médica. Mas em meados dos anos 70 um estudo mostrava que
cerca de 10% das adolescentes suecas eram anoréxicas. Em 1980
os transtornos psicológicos da alimentação já eram um dos
problemas mais frequentes entre as jovens universitárias americanas.
O gênero, no caso, é fundamental porque anorexia é muito mais
frequente entre moças. Também é importante a classe social: a
classe média é mais propensa a ela que os pobres.
Estudar
a anorexia e outros distúrbios alimentares tornou-se prioridade
médica. Aqui é preciso destacar o papel pioneiro da
psiquiatra americana Hilde Bruch, nos anos 70. Baseada em vasta
experiência, Bruch mostrou que a anorexia resultava de um conflito
entre o desejo de atender às expectativas sociais de uma silhueta
esbelta e a vontade de comer, fomentada pela mídia. E por que isso é
mais frequente no sexo feminino? Porque, diz Bruch, os rapazes têm
outras formas de expressar seus conflitos, através da revolta
juvenil, por exemplo. Entre as garotas, o perfil familiar também é
importante. A anoréxica vem de uma família em que o pai ou a mãe,
ou ambos, são pessoas bem-sucedidas, ambiciosas, preocupadas com
aparência física e a pressionar a filha para ser esbelta e
elegante. O resultado pode ser uma sobrecarga emocional
insuportável, com consequências devastadoras, até porque a
anorexia pode se acompanhar de distúrbios hormonais graves. E não
raro a jovem necessitará de acompanhamento terapêutico
especializado. Em termos de peso corporal, como em relação à carga
emocional, o ideal não é nem a falta nem o excesso. O ideal é o
equilíbrio, mas para isso a sociedade precisa se
conscientizar dos problemas representados pelos estereótipos que
cria.
Retirado da Revista Bem Viver – Mente & Cérebro, ano 13, n.152. Acessado em: 13/02/2015
www.acessaber.com.br
EXERCÍCIO DE FIXAÇÃO
1)
De acordo com o texto, como se caracterizam os distúrbios
alimentares?
2)
Qual problema a abundância de
comida e a voracidade traz para a saúde humana?
3)
Quais problemas a extrema obesidade
causa na saúde do ser humano?
4)
De acordo com o texto, qual era a maior
ameaça à saúde pública no passado? E por quê?
5)
Você concorda com dito popular corrente nos Estados Unidos:
“excesso de riqueza ou de magreza não prejudica”? Justifique sua
resposta.
6)
De acordo com o texto as mulheres
valorizadas no passado eram as “gordinhas” com nádegas
grandes. Essa realidade mudou. Hoje o “corpo transformou-se num
objeto a ser exibido”. Explique por quê?
7)
Atualmente a prioridade médica estudar os distúrbios alimentares,
então o que é anorexia nervosa?
8)
A anorexia nervosa, de acordo com o texto, esta associada as
adolescentes da classe média, porque é mais frequente no sexo
feminino?
9)
Em relação ao peso corporal e à sobrecarga emocional causada pela
busca do corpo perfeito, qual é a sugestão indicada pela Revista
Bem Viver?
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